O Levita indiferente


Série: Levitas - parte 3

Luciano Motta

A parábola do bom samaritano é bastante conhecida, uma história universal. Para refletirmos um pouco sobre o texto, é importante observarmos o contexto: antes de contar esta parábola, Jesus é interpelado por um escriba: “Mestre, que farei para herdar a vida eterna?” (Lucas 10.25)

Jesus devolve com outra pergunta: “Que está escrito na lei? Como lês?” (v.26)

O escriba responde com toda sua arrogância e eloqüência religiosa: “Amarás ao Senhor teu Deus de todo o teu coração, e de toda a tua alma, e de todas as tuas forças, e de todo o teu entendimento, e ao teu próximo como a ti mesmo” (v.27)

Jesus elogia, e toca na ferida: “Respondeste bem; faze isso, e viverás” (v.28)

O texto dá a entender que o escriba fica desconcertado com essa palavra. Sendo ele um graduado religioso, doutor da lei, conhecedor da vontade de Deus ao ponto de sintetizar os mandamentos sagrados em duas ações – amar a Deus sobre todas as coisas e amar ao próximo – este escriba não se dá por vencido e incita o debate com mais uma pergunta: “E quem é o meu próximo?” (v.29)

Quem é o SEU próximo?

Jesus conta a história de um homem que, descendo de Jerusalém a Jericó, é assaltado, espancado e abandonado semimorto à beira do caminho (v.30). O primeiro a passar ali é um sacerdote que, ao ver o moribundo, passa de largo (v.31). Depois passa um levita, que repete a indiferença do sacerdote (v.32). O terceiro transeunte é um samaritano, que se compadece do homem e o socorre, dando-lhe toda a assistência possível, pagando inclusive suas despesas (v.33-35).

– Ora, um samaritano! – deve ter pensado o escriba e todos que ouviam a parábola. Havia uma rixa histórica entre judeus e samaritanos. Seria inconcebível naquele contexto que um judeu, mesmo quase à morte, pudesse ser ajudado por um samaritano.

Jesus volta-se para o religioso e indaga: “Qual, pois, destes três te parece que foi o próximo daquele que caiu nas mãos dos salteadores?” (v.36) Este responde: “O que usou de misericórdia para com ele”. Então, Jesus encerra o debate de forma incisiva: “Vai, e faze da mesma maneira” (v.37).

O enfoque da parábola é a misericórdia, a compaixão pelo próximo.

Quantos músicos estão tão ocupados em seus serviços na igreja, preocupados com desempenho, qualidade sonora, musicalidade, e não se importam com as tragédias que acontecem dia a dia, às vezes tão próximo deles! Quantos trabalham no altar, nas dependências da igreja, mas agem exatamente como o sacerdote e o levita – passam de largo dos que estão desesperados, dos que tem a família destruída, dos que estão mortos espiritualmente ou mortos de fome!

Nosso envolvimento na igreja e com as coisas da igreja não podem nos aprisionar entre quatro paredes. O mundo clama por ação. Multidões anseiam por alguém que se importe com elas. Você se importa?

O bom samaritano nos lembra que podemos fazer algo por alguém, independente das diferenças, dos cargos, do status. Não é um trabalho para ser visto pelos homens. Não se enquadra nos holofotes dos cultos de domingo à noite. É para quem tem um coração puro da religiosidade pomposa, que faz acepção de pessoas. É para quem coloca a necessidade do outro acima da sua própria necessidade.

Sabe como ser curado da chaga da indiferença? Levante o traseiro do sofá, desligue a TV e faça algo por alguém. Deixe seus instrumentos tão caros um pouco de lado e vá para as ruas, visite o órfão, cuide da viúva, veja se seus vizinhos precisam de alguma ajuda. Há pessoas na sua própria família carentes muitas vezes de um abraço, de um ouvido, de uma palavra de encorajamento.

Quem ama a Deus faz alguma coisa por alguém.

...

Marcadores: ,